terça-feira, 9 de dezembro de 2025

 


Emendas vão ao palanque

(Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

Dúvida havia sobre a intenção eleitoreira e preferencial das emendas parlamentares, a Comissão Mista do Orçamento, reunida na semana passada, fez a gentileza de removê-la, quando decidiu colocá-las a reboque e refém da Lei de Meios de 2026. Já sem a intenção de camuflar o real interesse, e com os olhos nas urnas, os parlamentares Sujeitos que elas estejam devidamente liberadas até julho; se não totalmente, 65% do total, o que significa colocar à provisão alguns bilhões de reais para alimentar os redutos, no tempo em que faltando apenas três meses para se submeterem ao eleitorado.

A evidência agride o que resta de respeito na relação dos agentes políticos com a sociedade brasileira. Porque deixa claro, mais uma vez, que o dinheiro que o Executivo vai desembolsar tem a clara intenção de satisfazer as lideranças do interior, principalmente prefeitos amigos.

O esquema é velho conhecido como nosso. Com imensas abordagens, esse dinheiro, tão logo chegam aos municípios, os prefeitos contemplados cuidam de dar início a qualquer obra urbana, na área de saúde ou serviços correlatos. Fruto da ajuda do parlamentar local, que se candidata a novo mandato. Mas, de tal forma, que o empreendimento patrocinado fique limitado aos passos iniciais. Apenas dá-se o começo à implantação do projeto. O que resta da palavra recém-chegada, que costuma ser a parte maior, tem destino certo para os interesses da campanha eleitoral, e promoções populares, como shows de música sertaneja, do agrado de platéias pouco exigentes.

E o escândalo tripartido acaba ficando por isso mesmo. O Executivo paga, o Legislativo consome, o Judiciário faz de conta que a polícia. Daí, a tragédia: a que poder correr?, se todos estão embrulhados no mesmo balaio da grande irregularidade.

Há quem sonhe com uma distância e dificuldade de interferência da Justiça, com base no fato de que as emendas se transformaram em verdadeiros cabos eleitorais, que agem fora de época, à revelação do calendário, corrompem e – não menos grave – dão aos atuais deputados e senadores condições muitíssimo elaboradas na disputa com candidatos principiantes ou carentes de recursos. Pois foi preocupado com esses prejudicados que essa mesma Justiça distribuiu regras de financiamento de campanha, e impôs ao Congresso uma legislação de limites. Poderia, ao menos, anunciar que o dinheiro das emendas violentas o princípio de mínima igualdade de oportunidades no embate dos novos candidatos contra os veteranos. E distancia-se dos custos de renovação das bancadas do Congresso, o que se obtém em níveis muito modestos.
As emendas, que começarão a consumir cerca de R$ 13 bi, têm segurança na cobertura de alguns expedientes que o próprio Congresso criou para tentar agasalhá-las com ares de seriedade. Daí a sua força, que chega ao ponto mais audacioso quando se tornam impositivas; algo semelhante a uma ditadura do Legislativo sobre o Executivo, escândalo que só não balança os alicerces da democracia porque o Brasil vem se acostumando à invasão dos poderes, os três atropelados, que se confundem quanto a deveres e atribuições.

terça-feira, 2 de dezembro de 2025

 

Articulação em crise

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

A história se repete. Sempre quando chega dezembro, passa a figurar entre os encargos mais desafiadores para o governante cuidar da pauta de suas prioridades para o ano seguinte. Mesmo sendo algo difícil, é preciso tentar; pensar no que consertar ou dar prosseguimento ao que se herdou do exercício que vai terminar. Uma preocupação maior para presidente e ministros que detêm áreas estratégicas na chegada da hora inevitável de definir caminhos, muito mais agora, quando se aproxima o julgamento dos resultados de um período administrativo de três anos; o governo é chamado a prestar contas, o que fez e justificar as muitas coisas adiadas. Por acréscimo, o ano chega com a exigência de novos compromissos e, por mais, o fato de avizinhar-se a temporada eleitoral, marcadamente um período de cobranças.

Se parece não haver maior divergência quanto a isso, avaliam os analistas políticos as questões essenciais, sobre as quais deve refletir o governo Lula nesta fase de transição; como encarar os desafios que o aguardam no 2026 que vai chegando, e qual a disposição para enfrentá-los. Se são muitos e diversos esses desafios, a fixação de prioridades a que referimos torna-se indispensável, valendo afirmar que isso já independe da disposição do presidente de ter ou não plano de concorrer a novo mandato.

Diria, antes de tudo, que a primeira tarefa que aguarda o governo é a reorganização dos planos de articulação com as bases políticas que o sustentam, dentro e fora do Congresso. Ressente-se de melhores resultados nesse campo, mostra-se desguarnecido, o que atestam tropeços recentes, como a desastrosa derrubada de vetos no licenciamento ambiental, a mutilada PEC da segurança pública e a evidente má vontade do Senado na sabatina do candidato presidencial para a vaga aberta no Supremo Tribunal. Fatos que se somam a outros, para aprofundar a fase crítica entre os poderes Legislativo e Executivo.

As dificuldades têm origem no modelo geralmente adotado para as relações institucionais e partidárias entre presidente, senadores e deputados. Quando chegam os momentos de conflito tem faltado aos encarregados do diálogo maior competência para superar dificuldades, sobram impaciências e pressa nas retaliações. O que se tem visto são interlocutores temperamentais, o que, para o exercício da política, é remédio totalmente inadequado.

( Às queixas e críticas quanto à pobreza das articulações cabe uma ressalva, que, por justiça, vem em favor do PT. O governo lhe deve gratidão, pois o partido sabe como calar os sindicatos de trabalhadores e servidores, abafa greves, desestimula paralisações, o que tem sido um bálsamo para Lula. Com os problemas que temos hoje, fossem presidentes Collor, Fernando Henrique e Temer, as barricadas e piquetes estariam nas ruas. Entende-se: no tempo de outros governos o PT estimulou o espírito grevista, e aprendeu como anestesiá-lo. Nisso articula com destreza).

Aqui fala-se de uma desafiadora carência nas paragens do Executivo, mas não apenas nele. O balanço do velho ano igualmente deixa muito a desejar, quando se impõe avaliar as relações entre os três poderes. Não apenas um. Fica muito a desejar e deplorar, se se tem em conta que falta harmonia entre eles. Muitas vezes escapa até mesmo o diálogo respeitoso. O diálogo, como se viu neste 2025, dificultado em numerosos episódios, cedeu espaço para um poder avançar sobre atribuições do outro, confiscar prerrogativas e arranhar os princípios elementares da autonomia. Se ficou muito a desejar, conservemos a esperança de que se respeitem mais no novo ano.

terça-feira, 25 de novembro de 2025

 


Depois de Belém
Wilson Cid, hoje, no Jornal do Brasil
Reflexão que parece procedente, quando se tem em conta a avaliação da COP 30, responsável, nos últimos dias, por colocar o Brasil em destaque internacional, é que, realmente, assiste-se ao crescimento de uma preocupação quanto aos desafios do meio ambiente, em particular o clima. O que é dado animador, porque todos saem daqui um pouco mais conscientizado de que estamos, nós e o resto do mundo, diante de uma questão que precisa se sobrepor ao romantismo de naturalistas e interesses econômicos, mas o real desafio da humanidade para as décadas seguintes. Mesmo que ainda sobrevivam setores acomodados ou desinteressados, como o governo dos Estados Unidos, os árabes do petróleo, e até alguns integrantes do Brics, a indiferença vai, aos poucos, perdendo espaço. Belém do Pará, com todas as deficiências e senões, ajudou a constatar que há preocupação crescente com o clima; e isso já se conta como ponto favorável.

Essa particularidade, se permite certo alívio, também adverte quanto a novos e incansáveis esforços para que não caia no vazio tudo que se falou, que se denunciou em nome de um clima mais ameno. As poucas resoluções, mesmo que modestas diante das necessidades, não podem cair no esquecimento; nem cedam ao poder de conhecidos setores de resistência. Antes que prosperem, é preciso reagir, o que impõe, num capítulo seguinte ao recente encontro coordenado pelo Brasil, tratar de ações de continuidade. Belém precisa permanecer de plantão, e não se permitir ao pobre destino das conferências anteriores.

Temores fazem sentido. Tomemos como exemplo que, dez anos passados, em Paris, quando o tema já ensejava compromissos internacionais, projetos ambientais foram solenemente aclamados, com a promessa de que U$ 100 milhões seriam imediatamente aplicados. Não saíram de lá nem chegaram a lugar algum. O dinheiro, viu-se mais uma vez agora, é a grande questão: os sonhados 1,3 trilhão para socorrer o mundo asfixiado, não foram além de 3,4 bilhões; mesmo assim, suspeitíssimos, porque têm de sair de setores privilegiados, como os poços de petróleo dos árabes e do armamento, que sempre foi guloso consumidor de orçamentos.

Despedidas as delegações que estiveram em Belém, de volta aos países de origem, cabe indagar qual o passo seguinte para que preocupações tão longamente debatidas sejam honradas e avancem ao campo da objetividade; para que essa COP não esteja condenada, como suas antecessoras, a mero papel de simpósio de boas intenções, sem decorrências eficazes. E que as preocupações com o clima deixem de ser tradicionais reféns de tediosos e improdutivos relatórios. .

Os trabalhos em Belém, é bem sabido, não conseguiram vencer certa má vontade de importantes lideranças, estas costumeiramente desconfiadas de que temas como a proteção do clima, a renovação de fontes de energia e a proteção das reservas florestais, mesmo que desejáveis, conflitam com o desenvolvimento das economias produtivas. Vem logo à lembrança o boicote americano, além de certo descaso de russos, árabes e africanos.

Estamos cada vez mais convencidos de que a grande causa climática devia ser acolhida como real prioridade pela Organização das Nações Unidas, em cujas portas batem as maiores aspirações de todo os povos.

sexta-feira, 21 de novembro de 2025

 

A Pauta é Política
21 de novembro de 2025

ESCRAVOS
Há 170 anos, neste dado, a Câmara Municipal informou, então oficialmente, que naquele ano de 1855 a população de Juiz de Fora era de 27.722 pessoas, das quais 118 estrangeiras. Considerava-se, em separado, os 16.428 escravos, em suas maiorias técnicas na zona rural. Esse número já permitia afirmar que, em matéria de população negra, só perdíamos para Leopoldina.

À VENDA
A Comissão Especial da Assembleia está estudando, nesta semana, a reavaliação dos imóveis que o estado pretende vender, e, com isso, abater a dívida de 180 bilhões que o Estado tem com a União. O objetivo principal é retirar da lista os imóveis ligados às atividades de ensino. Na relação original, entre os imóveis de Juiz de Fora colocados à venda estava o Cândido Tostes, escola de laticínios, depois excluído.
O facto é que o Estado não conseguiu fazer bons negócios. Da cidade, permanece em oferta o Expominas. Ninguém quer saber dele.

A DIREITA
O senador mineiro Carlos Viana, que vem obtendo popularidade, como presidente da CPI que tenta apurar o escândalo do roubo praticado contra os investidores do INSS, começou a insistir na necessidade de as correntes políticas de direita se unirem, como primeiro passo para ganhar, em 2026, a Presidência da República. Considere que sem a unidade não há segurança.

TEMÁTICA
Há quem arrisque a possibilidade de uma próxima campanha pela sucessão presidencial abrir algum espaço para a influência de temas momentosos da política externa, algo difícil de prever, se considerarmos que o brasileiro já tem pela frente uma vasta pauta de problemas, sem vagar para deixar-se influenciar pelo que o governo fez ou deixou de fazer na diplomacia. Custa admite que se preocuparia com as discussões entre Trump e Lula, mesmo sob o risco de se agravarem. Ou, também duvidoso, se deixar o voto comover-se pelo fiasco da oferta do Brasil para trabalhar a pacificação dos ânimos tensos entre Estados Unidos e Venezuela, oferta de boa vontade que os litigantes jogaram no lixo. Talvez menos inviável, quem sabe, possam ser os desdobramentos externos da COP 30, quando servirmos de cenário para abordar questões com o clima.

SOB RESERVA
Ainda não está bem contada a história do senador Rodrigo Pacheco aposentar-se em definitivo da política, depois de duas grandes dificuldades que o barraram. A primeira foi a tentativa de construir uma aliança suficientemente forte para disputar o governo de Minas, mesmo com a promessa do presidente Lula de apoiá-lo. Depois, o fracasso de ver viabilizada a indicação de seu nome para a vaga de Luiz Barroso no Supremo Tribunal Federal.
Por que se diz que essa história pode ter outros caminhos? Ele seria um nome para a próxima vaga no Superior Tribunal de Justiça, além de se ter como certo que o senador mineiro pode ser cogitado para compor a chapa de Lula em 2026.

Mas aí há um detalhe que precisa ser avaliado. Sendo Lula candidato a um quarto mandato, estando ele com mais de 80 anos em 2026, a disputa pela vice será feroz.

quarta-feira, 19 de novembro de 2025

 

Para discutir a sucessão

(Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

As atividades intensas com que se processaram na COP-30, dominando as prioridades do governo, acabaram por reduzir a segundo plano outras questões prioritárias, como a discussão complicada sobre a maneira de construir uma política eficiente de segurança pública; como também dominaram a agenda presidencial e imobilizaram parte das atividades parlamentares. Finda uma grande conferência sobre o clima, com todas as incertezas sobre o que dela se vai obter, os setores políticos devem redobrar atenções no campo da sucessão presidencial até porque, a partir de agora, distantes só onze meses das eleições, tudo que se fizer, tudo que se decidir terá olhos voltados para as urnas de 26; tanto os olhos dos que governam como os que fazem oposição.

Um raciocínio que parece autorizado evidencia-se nas pesquisas, mesmo que elas sejam comprovadas sob justas reservas, considerando-se o pleito ainda distantes e os muitos cenários que podem se alterar em razão dos acontecimentos e das imprevisibilidades. Revelam, com insistência, que estamos diante de um eleitorado rachado ao meio. Breves alterações de números e nomes não refletem tendência a mudanças substanciais nesse panorama, fruto da radicalização, tal como em 2022. Quanto a isso não há discordâncias.

(Então, o que há hoje de concreto? Duas realidades: o governo sabe que o melhor projeto é trabalhar para a reeleição do presidente, porque não lhe resta outro caminho com potencialidade, e, na outra ponta da corda esticada, a direita fragmentada por ambições de ocasião e sem saber até onde confiar na herança do bolsonarismo.)

Há uma preocupação crescente com o destino sombrio da segurança, porque o país mergulhou num estágio em que o crime, cada vez mais organizado, contrasta com o poder público, confundindo quanto às políticas de enfrentamento mais adequadas. É assunto que tem garantia de vaga na campanha pelos votos, quando os candidatos, quaisquer que sejam seus partidos ou convicções ideológicas, tenham de mostrar ao eleitor o que não souberam fazer para tornar a situação mais segura ou, se não tanto, menos vulneráveis. Curioso sentir que caminhamos para uma eleição em que o estado organizado, das instituições e das leis, tem de se expor, enquanto as organizações ilegais convém o refúgio e a proteção das favelas e dos complexos, onde as operações policiais são visitas indesejáveis. Uma segurança ineficiente é que terá de subir ao palanque de governantes e oposicionistas. Por outro lado, como sabemos, as violações deixam claro os candidatos que apoiam.

Há quem arrisque a possibilidade de uma próxima campanha pela sucessão presidencial abrir algum espaço para a influência de temas momentosos da política externa, algo difícil de prever, se considerarmos que o brasileiro já tem pela frente uma vasta pauta de problemas, sem vagar para deixar-se influenciar pelo que o governo fez ou deixou de fazer na diplomacia. Custa admite que se preocuparia com as rusgas entre Trump e Lula, mesmo sob o risco de se agravarem. Ou, também duvidoso, se deixar o voto comover-se pelo fiasco da oferta do Brasil para trabalhar a pacificação dos ânimos tensos entre Estados Unidos e Venezuela, oferta de boa vontade que os litigantes jogaram no lixo. Talvez menos inviável, quem sabe, possa ser os desdobramentos externos da COP 30, quando servirmos de cenário para abordar questões com o clima.

Seria bom sinal de aperfeiçoamento do eleitorado vê-lo também preocupado com as ações externas, e como andam nossas responsabilidades num mundo onde não estamos sozinhos, mas prontos a pagar pelos homens que a todos atormentam.


sexta-feira, 14 de novembro de 2025

 




A cidade ea República


Sempre foi objeto de interesse dos historiadores o fato de a proclamação da República ter sido logo aceita e festejada na cidade, geralmente mencionado como uma das mais influentes do Império, notadamente na segunda metade da gestão de D Pedro II. Juiz de Fora era muito prestigiada no Império, cinco vezes visitada oficialmente pelo imperador, num tempo em que sai de Petrópolis e chega aqui custava 14 horas de sacrifícios em viagem de diligência e revezamento de mulas. É certo que ele e a corte dedicavam muita atenção às figuras proeminentes locais. O que comprova o fato de que, naquele 15 de novembro, 136 anos passados, quando estava sendo inaugurada a república, residiam aqui 29 barões e viscondes, com um detalhe para ampliar consideravelmente a nobreza juiz-forana: entre aqueles 29 nada menos de 10 foram presidentes de províncias, o que equivaleria, hoje, ao cargo de governador de estado.


Pois, não é que, apesar de toda aquela prestígio, a queda do amigo D. Pedro foi rapidamente assimilada pelas lideranças locais. Pedro Nava, no “Balão Cativo”, escreveu, veementemente: “A cidade aderiu à república com o mesmo açodamento indecente do resto da província”. Quanto aos nobres, a adesão ficou perto da unanimidade. Houve o caso singular de Manoel José Vieira Tosta, barão de Muritiba, ex-presidente de Pernambuco e Sergipe: tão logo soube do banimento, vendeu o solar da rua Direita, doou as ações que tinha do Colégio Progresso para estudantes pobres, e, voluntariamente, acompanhou D Pedro rumo ao exílio.


Pelos jornais, e segundo numerosos depoimentos de historiadores, o Império vivia dificuldades crescentes. Em Juiz de Fora, como em outros grandes centros de produção cafeeira, a abrupta libertação dos escravos comprometeu interesses, e essa foi uma contribuição para que a corte ruísse.


O DIA D


Quando chegou na manhã de 15 de novembro, os monarquistas derrotados e os republicanos vitoriosos só sabiam à noite, porque o telégrafo não funcionava, resultado de um violento temporal, que chegou com negociações de granizo e desabou durante 15 minutos. Contaram os jornais que chegaram a cair pedra do tamanho de ovo, com muita destruição, o Fórum totalmente destelhado, casas destruídas, os morros da cidade ficaram brancos…


Só foram saber da novidade à noite, com o telégrafo parcialmente restaurado. Os republicanos concentraram-se no Café Imprensa, Rua Direita, 41, que aconteceram abertos, para as comemorações, durante toda a madrugada. O primeiro telegrama que chegou, confirmando o fim do Império, foi afixado na parede. Os vitoriosos subiram à rua Halfeld, motivados por Heitor Guimarães, cantando versão tupiniquim da Marselhesa.


Uma festa que passou quente, mas sem que se registrassem grandes problemas para a polícia.


(Sobre o clima daqueles dias, um fato pitoresco, que veio dos últimos anos do velho regime: antes de surgir a Praça da Estação, havia no local um espaço cercado para criação de porcos. Ali se revesavam, carregando cartazes, monarquistas e republicanos, com mútua ofensa: diziam ser o lugar apropriado para pregar suas ideias, sob aplausos da plateia suína…)



OS REPUBLICANOS

Se, como se disse, Juiz de Fora era uma referência de prestígio monarquista, seria incorreto negar a importância ativista dos republicanos, muito presentes nos corredores e salas do Fórum. Entre eles, há quatro destaques a registrar: Constantino Paleta e Luiz Detzi, com 27 anos de idade, João Penido, Francisco Isidoro, que completara 25 anos, e o vereador Fonseca Hermes, mais tarde convidado por Floriano Peixoto para a Secretaria-Geral da Presidência da República, o que equivaleria à atual Casa Civil.


(Penido havia se notabilizado, pouco antes, quando, na solenidade de sua formatura, no Rio, recusara-se a beijar a mão do imperador no palácio São Cristóvão. O castigo seria a suspensão imediata da carta de doutorado, mas o próprio D Pedro impediu que a punição fosse aplicada).


Naquelas primeiras horas já havia uma divergência entre as novas eminências, que prosperou por algum tempo. Na formação do Conselho de Intendência, primeira ação política do novo tempo, lá estavam Constantino, Detzi e Isidoro, mas, num cochilo, deixaram que a presidência caísse nas mãos de Antero José Lage Barbosa, que vinha do conselho anterior, de formação monarquista… Isso porque os republicanos tinham seus problemas internos. Como se viu na noite de 20 de julho de 1888, quando o notável pregador Silva Jardim veio para falar, no Teatro Provisório, na rua Halfeld, mas teve de sair do palco, até que o auditório parasse de brigar.



A IMPRENSA


Menos acomodados que os amigos do imperador, os simpáticos à república vinham se utilizando largamente da imprensa para a divulgação de seus planos de mobilização e estimular a população a apoiar o novo regime. Conta Almir de Oliveira em “A Imprensa em Juiz de Fora”, página 35, que “o combate à monarquia suscitou o jornalismo republicano”, mesmo que, em sua maioria, valendo-se de jornais de efêmera duração. O primeiro foi “A Bússola”, de 1881, semanário de três colunas, editado por Eduardo Ludolf e Carlos Muratori, tendo Inácio Gama como redator-chefe. Lembremo-nos que Inácio foi o primeiro historiador da cidade.


Depois, vieram “O Echo do Povo”, em cujas páginas vai surgir o mais agitado dos nossos republicanos, João Severiano Fonseca Hermes, antecedendo o lançamento de “A Propaganda”, em 1886. Ali estavam, além de Hermes, Constantino Paleta, João D’Ávila, Avelino Lisboa, precedendo a circulação do “15 de Novembro”, de Leovegildo Apense. Treze anos depois, 1894, mesmo com a república constitucionalizada, temeroso de que a monarquia ainda era uma ameaça, Estêvam de Oliveira criou o “Correio de Minas”. Custou acreditar que a História havia virado a página.

 




A cidade e a República


Sempre foi objeto de interesse dos historiadores o fato de a proclamação da República ter sido logo aceita e festejada na cidade, geralmente citada como uma das mais influentes do Império, notadamente na segunda metade da gestão de D Pedro II. Juiz de Fora era muito prestigiada no Império, cinco vezes oficialmente visitada pelo imperador, num tempo em que sair de Petrópolis e chegar aqui custava 14 horas de sacrifício em viagem de diligência e revezamento de mulas. É certo que ele e a corte dedicavam muita atenção às figuras preeminentes locais. O que comprova o fato de que, naquele 15 de novembro, 136 anos passados, quando estava sendo inaugurada a república, residiam aqui 29 barões e viscondes, com um detalhe para ampliar consideravelmente a nobreza juiz-forana: entre aqueles 29 nada menos de 10 foram presidentes de províncias, o que equivaleria, hoje, ao cargo de governador de estado.


Pois, não é que, apesar de todo aquele prestígio, a queda do amigo D. Pedro rapidamente foi assimilada pelas lideranças locais. Pedro Nava, em “Balão Cativo”, escreveu, veemente: “A cidade aderiu à república com o mesmo açodamento indecente do resto da província”. Quanto aos nobres, a adesão ficou perto da unanimidade. Houve o caso singular de Manoel José Vieira Tosta, barão de Muritiba, ex-presidente de Pernambuco e Sergipe: tão logo soube do banimento, vendeu o solar da rua Direita, doou as ações que tinha do Colégio Progresso para estudantes pobres, e, voluntariamente, acompanhou D Pedro rumo ao exílio.


Pelos jornais, e segundo numerosos depoimentos de historiadores, o Império vivia crescentes dificuldades. Em Juiz de Fora, como em outros grandes centros de produção cafeeira, a abrupta libertação dos escravos comprometeu interesses, e essa foi uma contribuição para que a corte ruísse.


O DIA D


Quando veio a manhã de 15 de novembro, os monarquistas derrotados e os republicanos vitoriosos só ficaram sabendo à noite, porque o telégrafo não funcionava, resultado de um violento temporal, que chegou com precipitação de granizo e desabou durante 15 minutos. Contaram os jornais que chegou a cair pedra do tamanho de ovo, com muita destruição, o Fórum totalmente destelhado, casas destruídas, os morros da cidade ficaram brancos…


Só foram saber da novidade à noite, com o telégrafo parcialmente restabelecido. Os republicanos concentraram-se no Café Imprensa, Rua Direita, 41, que permaneceu aberto, para as comemorações, durante toda a madrugada. O primeiro telegrama que chegou, confirmando o fim do Império, foi afixado na parede. Os vitoriosos subiram a rua Halfeld, motivados por Heitor Guimarães, cantando versão tupiniquim da Marselhesa.


Uma festa que passou quente, mas sem que se registrassem grandes problemas para a polícia.


(Sobre o clima daqueles dias, um fato pitoresco, que veio dos últimos anos do velho regime: antes de surgir a Praça da Estação, havia no local um espaço cercado para criação de porcos. Ali se revesavam, carregando cartazes, monarquistas e republicanos, com mútua ofensa: diziam ser o lugar apropriado para pregar suas ideias, sob aplausos da plateia suína…)



OS REPUBLICANOS

Se, como se disse, Juiz de Fora era uma referência de prestígio monarquista, seria incorreto negar a importância ativista dos republicanos, muito presentes nos corredores e salas do Fórum. Entre eles, há quatro destaques a registrar: Constantino Paleta e Luiz Detzi, com 27 anos de idade, João Penido, Francisco Isidoro, que completara 25 anos, e o vereador Fonseca Hermes, mais tarde convidado por Floriano Peixoto para a Secretaria-Geral da Presidência da República, o que equivaleria à atual Casa Civil.


(Penido havia se notabilizado, pouco antes, quando, na solenidade de sua formatura, no Rio, recusara-se a beijar a mão do imperador no palácio São Cristóvão. O castigo seria a suspensão imediata da carta de doutorado, mas o próprio D Pedro impediu que a punição fosse aplicada).


Naquelas primeiras horas já havia uma divergência entre as novas eminências, que prosperou por algum tempo. Na formação do Conselho de Intendência, primeira ação política do novo tempo, lá estavam Constantino, Detzi e Isidoro, mas, num cochilo, deixaram que a presidência caísse nas mãos de Antero José Lage Barbosa, que vinha do conselho anterior, de formação monarquista… Isso porque os republicanos tinham seus problemas internos. Como se viu na noite de 20 de julho de 1888, quando o notável pregador Silva Jardim veio para falar, no Teatro Provisório, na rua Halfeld, mas teve de sair do palco, até que o auditório parasse de brigar.



A IMPRENSA


Menos acomodados que os amigos do imperador, os simpáticos à república vinham se utilizando largamente da imprensa para a divulgação de seus planos de mobilização e estimular a população a apoiar o novo regime. Conta Almir de Oliveira em “A Imprensa em Juiz de Fora”, página 35, que “o combate à monarquia suscitou o jornalismo republicano”, mesmo que, em sua maioria, valendo-se de jornais de efêmera duração. O primeiro foi “A Bússola”, de 1881, semanário de três colunas, editado por Eduardo Ludolf e Carlos Muratori, tendo Inácio Gama como redator-chefe. Lembremo-nos que Inácio foi o primeiro historiador da cidade.


Depois, vieram “O Echo do Povo”, em cujas páginas vai surgir o mais agitado dos nossos republicanos, João Severiano Fonseca Hermes, antecedendo o lançamento de “A Propaganda”, em 1886. Ali estavam, além de Hermes, Constantino Paleta, João D’Ávila, Avelino Lisboa, precedendo a circulação do “15 de Novembro”, de Leovegildo Apense. Treze anos depois, 1894, mesmo com a república constitucionalizada, temeroso de que a monarquia ainda era uma ameaça, Estêvam de Oliveira criou o “Correio de Minas”. Custou acreditar que a História havia virado a página.